Recentemente me deparei com um artigo sobre a máquina de anticítera: o primeiro computador analógico e planetário do mundo descoberto em 1901 em um naufrágio da era romana perto da ilha mediterrânea de Anticítera. O artefato é uma peça de engenharia extremamente complexa que foi usada como uma espécie de mapa astrológico para traçar os movimentos dos planetas, os ciclos do sistema solar, bem como a posição e as fases da lua.
O mais intrigante dessa descoberta é que a máquina foi construída há mais de 2.000 anos atrás — período em que os cientistas consideravam que a tecnologia da época seria incapaz de construir algo parecido. Para você ter uma ideia do tamanho da desinformação desse tipo de tecnologia, máquinas com complexidades semelhantes só surgiram no século 18. Mesmo 122 anos após sua descoberta, ainda existem dúvidas sobre seu funcionamento e utilidade e por isso é considerado um dos maiores enigmas da ciência humana.
Isso me levou a algumas reflexões sobre o quão pouco sabemos sobre o passado. A máquina deixou claro que a astronomia e a matemática antiga eram muito mais avançadas do que se imaginava.
A revista Nature coloca isso em perfeitas palavras:
"O antigo mecanismo de Anticítera não apenas desafia nossas suposições sobre o progresso da tecnologia ao longo das eras - ele nos dá novos esclarecimentos sobre a própria História."
Se pensarmos na história do conhecimento humano, percebemos que sempre estivemos vulneráveis a eventos destrutivos de informações, livros e bibliotecas que inevitavelmente atrasaram o progresso do conhecimento humano. Basta olhar para a lista de bibliotecas que foram deliberadamente ou acidentalmente destruídas para entender porque nosso passado distante é realmente um vácuo preenchido por fragmentos desconexos.
Até o final do século 18, cientistas como o bispo James Ussher ainda calculavam a idade da Terra em 6.000 anos com base em genealogias bíblicas. Outros cientistas da época também acreditavam que a Terra era muito mais jovem do que a estimativa atual de 4,54 bilhões de anos. No entanto, os livros antigos da tradição bramânica, com uma história que remonta a mais de 3.000 anos, já estimavam que o tempo de vida desse universo era de cerca de 4,32 bilhões de anos, ou seja, não muito diferente dos cálculos atuais.
Platão também foi um dos contribuintes da sociedade que teve parte de seu conhecimento jogado no vácuo do espaço. Segundo os pesquisadores, muito provavelmente os livros Timeu e Crítias foram uma trilogia que terminou com o livro Hermócrates, mas que nunca foi encontrado. Se os dois primeiros livros da série tratam de conceitos brilhantes e particularmente avançados sobre a origem do universo, a criação do homem e a proporção áurea, imagine o que Hermócrates não abordaria.
Muito conhecimento foi perdido principalmente porque as informações eram armazenadas em materiais perecíveis. Embora o surgimento da internet tenha solucionado esse problema a partir do armazenamento de informações em servidores de nuvem, as organizações que coletam e armazenam as informações ainda não fornecem uma base verdadeiramente confiável e permanente de proteger o conhecimento coletivo para as gerações futuras. Frequentemente, dados, sites e materiais que compõem a internet são alterados, editados, censurados ou totalmente removidos do sistema.
Um bom exemplo disso foi a Cambridge University Press (CUP) que em 2017 censurou mais de 300 artigos acadêmicos em seu período China Quarterly para garantir que pudesse continuar a publicar na China, onde as autoridades chinesas controlam a publicação de materiais que eles consideram politicamente sensíveis. O que infelizmente significa que, assim como os livros físicos, a informação digital também é vulnerável a ataques e censuras por motivos políticos, religiosos ou culturais.
A boa notícia é que esse problema parece estar chegando ao fim. Através da tecnologia blockchain foi possível a invenção da tecnologia blockweave: um derivado do blockchain que garante criptograficamente a impossibilidade de destruir, falsificar ou modificar os dados armazenados.
A blockweave é uma estrutura semelhante a blockchain só que baseada em um novo mecanismo de consenso de prova de acesso que torna o armazenamento de dados verdadeiramente permanente, mesmo que o criador original dos dados não esteja mais presente. A tecnologia foi desenvolvida pelos criadores do Arweave com a ideia de resolver exatamente o problema da impermanência de dados na internet e assim conseguir criar uma biblioteca de armazenamento universal permanente e descentralizada.
Não sei se estou sendo muito otimista, mas à medida que a tecnologia se expande, acredito que ela se tornará uma curadoria permanente do conhecimento da história humana.
Além disso, através da criação de arquivos verdadeiros e descentralizados, será muito difícil construir sistemas baseados em informações manipuladas ou que praticam a censura. Qualquer novo conceito ou ideologia criado por um indivíduo pode ser permanentemente inserido em seu próprio site descentralizado, o que impossibilita alterações e garante sua integridade.
Assim como o dinheiro não é mais propriedade exclusiva do governo, as informações históricas e socialmente importantes também não serão mais propriedade de instituições centralizadas.
Se você estiver interessado em ler mais sobre o projeto Arweave, confira o blog deles aqui.